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Mulheres ocupam a cena da discotecagem

Mesmo com pouco espaço e muito preconceito, DJ’s esbanjam talento e ocupam o cenário cultural Brasil afora

Por Edmar Neves

Leia ouvindo a playlist exclusiva que a DJ Thais preparou para a gente…

O universo da música pode ser bastante ambíguo. Ao mesmo tempo em que nos ajuda a mudar nossa mentalidade, derrubando diversas barreiras linguísticas e culturais com ritmos e melodias cativantes, também pode fortalecer velhas estruturas, dando pouco espaço a mudanças e menos ainda à diversidade.

Uma mulher dj.
Créditos: Divulgação

Um reflexo dessa ambiguidade é o fato de que, mesmo que não faltem mulheres talentosas no mundo da discotecagem, a representatividade feminina ainda é bastante tímida. E isso não só nos grandes festivais do Brasil, como podemos ver nas últimas edições do XXXPERIENCE e do Tribe, mas também nas baladas que ocorrem nos finais de semana em várias cidades do país.

No entanto, apesar das dificuldades para alcançar posições de destaque no meio cultural, muitas mulheres DJs têm rompido as limitações do machismo com bastante talento e perseverança. A fim de entender melhor sobre a presença feminina nos cenários da música brasileira, conversamos com Thais Redig, dentista e DJ paraense que já tocou em baladas de diversas cidades, como Curitiba/PR, e que agora vive no Rio de Janeiro/RJ.

“Entrei no mundo da discotecagem entre 2015 e 2016 e foi meio que no entusiasmo. Eu produzia alguns eventos, abriu uma brecha entre as atrações de um festival, e um amigo perguntou se eu não queria discotecar, já que tinha vários discos de vinil… e foi assim que comecei”, nos conta Thais sobre o início de sua trajetória.

Referências no mundo da música

Ainda sobre o seu começo nos palcos, a DJ reflete que, além dos gêneros musicais brasileiros – como o samba, o forró, o coco e o maracatu –, os quais fazem parte do repertório de suas discotecagens, suas principais referências nesse âmbito foram de homens, principalmente em contextos de aprendizado.

Uma mulher com fones de ouvido olhando para cima.
A DJ Thais Redig. Acervo Pessoal.

Quando olho a minha história, consigo enxergar vários homens e poucas mulheres nesse lugar de ensino. E isso é bem questionável”, comenta Thais. “Eu brinco que, nos lugares em que fui tocar, nunca vi uma técnica de som mulher. São sempre homens que estão nesses espaços de produção dos eventos e não são todos que dão abertura para que possamos tocar”, complementa.

Nesse sentido, a profissional afirma que, para uma mulher conseguir assumir diversas posições no mundo da discotecagem, frequentemente é necessário contar com a boa vontade de homens inseridos em pontos estratégicos do meio.

“Em vários momentos, eu sinto que estou compondo o line-up de um evento apenas para ser a cota de mulheres no festival, ou o rostinho bonito no palco. A questão principal é saber o que fazer com isso e, no meu caso, eu dou o meu melhor, chego com o pé na porta para deixar claro que nós mulheres somos capazes e não precisamos do favor de ninguém para tocar”, diz Thais.

Dificuldades e muita resiliência

De acordo com Thais, a maior dificuldade enfrentada por mulheres na área da discotecagem está relacionada à infraestrutura do meio. Isto é, à capacidade da organização do evento em convidá-las para participarem e, além disso, em dar condições mínimas para elas mostrarem todo o seu potencial.

Vejo que um dos calos que a gente encontra é em relação aos técnicos de som, já que é raro encontrar um técnico que respeite nosso espaço, sendo que na maioria das vezes temos que montar nosso equipamento, provar que não vamos estragar nada e nem ‘dar trabalho’ para ninguém”, ela explica.

Por sua vez, essa falta de oportunidades para iniciar e amadurecer o trabalho no mundo da música e, mais especificamente, da discotecagem impede que muitas mulheres tenham como começar a atuar como artistas.

Créditos: Divulgação

“Lembro de um evento que participei em homenagem às mulheres, no qual tiveram que chamar homens para tocar alguns instrumentos, pois, mesmo com várias mulheres se esforçando ao máximo para fazer o evento acontecer, elas não conseguiram pessoas o suficiente naquela cena para montar uma banda”, diz a DJ.

Afora essas importantes questões, Thais também ressalta que, antes, há ainda uma das principais barreiras pessoais a se superar: a ideia de que não se é boa o suficiente. “Para um homem é muito fácil ir ao evento, tocar qualquer coisa de qualquer forma e está tudo bem. Já para a gente, há uma forte síndrome da impostora, de não se achar capaz de fazer a discotecagem, ou, ainda, de ter sempre que ser melhor em tudo e não poder errar”, destaca Thais.

Exemplificando o impacto de tudo isso, a DJ explica ter levado oito anos discotecando em eventos para sentir firmeza na sua atuação.

“Mas, mesmo com todas essas dificuldades, vamos lá e fazemos nosso trabalho da melhor maneira possível, mostrando que não ficamos atrás de nenhum homem”, conclui.

A importância de estar na cena

Ainda que com os vários obstáculos atinentes à garantia da presença feminina nas cenas culturais de cada região, Thais reitera a extrema importância desse esforço. Isso tanto para assegurar uma diversidade dentro da música quanto para estimular que outras mulheres comecem a se expressar artisticamente.

“O bom de todo esse movimento é que já existem lugares que estão realmente preocupados em garantir essa diversidade. Dando um exemplo da cena aqui do Rio, o Circo Voador é um local que abre espaço para mulheres, para pessoas negras e para a comunidade LGBTQI+, sendo que foi lá onde eu fiz os melhores shows da minha vida”, comenta.

Outro ponto importante é que o aumento dessa representatividade nos palcos reflete em um retorno muito positivo do público, principalmente feminino, o qual se sente mais confortável e aproveita melhor o show. “Quando eu começo a tocar é sempre um momento muito mágico, pois a mulherada vai para a beira do palco, começa a dançar e curtir de fato a festa”, diz a DJ. “É até engraçado, porque, quando acabo de tocar, a mulherada fica pedindo para eu permanecer”, afirma.

Uma mulher dj.
A DJ Thais Redig. Acervo Pessoal.

“Eu entendo que toda essa movimentação é muito boa para nós, pois vendo toda a minha trajetória até aqui, agora posso apontar diversas referências de mulheres que fazem acontecer dentro da música”, reflete Thais. “E é isso. Chega de ter referências só de homens na hora de tocar, né? A gente já sabe que eles são bons, pois estão há muito tempo praticando. Agora é a nossa vez de mostrar nossa capacidade e a nossa qualidade”, finaliza.

Mulheres DJ’s que arrasam na pista
Em seus trânsitos por diferentes espaços, Thais manteve contato com várias artistas e coletivos de inúmeras regiões, afirmando seguramente que existem mulheres tocando de norte a sul no Brasil. Visando conhecer um pouco mais dessas cenas diversas, pedimos a ela algumas indicações de DJ’s e coletivos femininos que despontam no cenário da discotecagem.

A primeira recomendação é a produtora musical, dançarina e pesquisadora de múltiplas artes DJ Bieta, natural de Porto Alegre/RS, mas que vive atualmente no Rio de Janeiro/RJ. Em suas apresentações, Bieta mistura música eletrônica com elementos percussivos e afro-brasileiros, trazendo também aspectos da MPB (Música Preta Brasileira), expandindo, assim, as possibilidades sonoras.

Em Belém/PA, a DJ Nat/esquema agita o meio cultural não só através da discotecagem, mas também de cursos, oficinas e produções de eventos nos quais há um forte protagonismo feminino. Além de tudo isso, Nat também integra uma cena de colecionadores de vinil bastante ativa em Belém.

Já a DJ Góia nasceu em Campo Grande/MS, mas atua em Florianópolis/SC. Seu repertório abrange ritmos tradicionais brasileiros, como o samba, o brega, o coco e o maracatu, trazendo pitadas de soul e funk embaladas com música eletrônica. Além de sua atuação como DJ, Góia também faz parte do coletivo As Mina do Som, de Florianópolis.

Outra figura de destaque é a DJ TataOgan, de Niterói/RJ. Ela faz uma mistura da música afro-brasileira, nordestina, africana e latina com a MPB (Música Popular Brasileira) e a eletrônica europeia. TataOgan também é fundadora da festa Vitrolinha, que ajuda a movimentar a cena cultural de Niterói, na Praça da Cantareira, e cocriadora do coletivo UH! Manas TV, o qual conta com várias integrantes, principalmente da cidade de São Paulo. 

Por falar no UH! Manas TV, o coletivo surgiu em 2020, durante a pandemia de Covid-19, e teve como primeiro objetivo divulgar a produção de mulheres DJs através de transmissões ao vivo na internet. Agora, o enfoque do coletivo é a realização de um mapeamento de mulheres que atuam na discotecagem, buscando garantir o registro de suas atividades e a criação de redes de contato e apoio para impulsionar mais ainda as cenas musicais do país. Atualmente, o grupo está com uma mostra virtual chamada “Uh! Manas TV – Mulheres Reinventando a Rede com Música”.

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