Por Edmar Neves

Ao longo dos séculos, as livrarias se solidificaram não só como um espaço para o comércio de livros, mas também como um local de produção e disseminação cultural. Todos os amantes da leitura devem ter uma história relacionada a esse espaço, como uma conversa com um vendedor que acabou definindo o gosto por determinados gêneros, a descoberta de obras marcantes ou a compra de um livro que impactou toda uma vida.

Assim como as histórias presentes nas páginas dos livros dentro desse espaço que promove conhecimentos, cultura, sonhos e paixões também amores, amizades, parcerias, movimentos culturais e tantas aventuras tiveram início ou se desenvolveram.

Mas com as crises que desaguam no mercado livreiro brasileiro – e suas consequentes mudanças que atingem o setor de ponta a ponta – inovar é preciso. A chegada de grandes empresas de e-commerce no país, que tornaram o ato de ir a uma livraria comprar um livro quase obsoleto e praticam preços que tornam a competição de livrarias pequenas quase inviável, diversos estabelecimentos tiveram que investir pesado em programações culturais para se manterem com as portas abertas.

Assim, livrarias de rua potencializaram sua vocação de serem pequenos centros culturais atraindo não só intelectuais como um público bastante amplo em eventos como lançamentos de livros, saraus, shows musicais, exposições, palestras, instalações e performances artísticas, entre outros, dando novos significados para o espaço e se tornando pontos turísticos badalados nas cidades.

Livros, eventos culturais e uma boa cachaça

“Toda livraria é um ponto de cultura, mesmo que ela não saiba ou diga que não é, porque as pessoas vão até lá em busca de cultura: cultura impressa”, reflete Bruno Eliezer, dono da Livraria Ponta de Lança, localizada na cidade de São Paulo. A livraria surgiu como um sebo online em 2018 e abriu suas portas em um local físico em 2021. 

Bruno explica que, para além de uma grande diversidade de títulos junto de boa curadoria, um ponto essencial da boa livraria é a seleção personalizada de títulos que atendem aos gostos e às demandas de cada pessoa.

“Você pode ter uma livraria com 10 mil títulos, mas é vital conversar com o livreiro, aprender com ele, permitir que ele aprenda com você”, diz. 

“Às vezes eu tenho vários títulos de um mesmo tema, mas não preciso apresentar todos os livros para a pessoa e sim entender o que ela necessita e mostrar dois ou três títulos que atendam o que ela está buscando”, complementa Bruno.

E o espaço é bem servido de título. Lá o acervo principal é composto por literatura brasileira, com obras que vão desde os grandes clássicos até autores mais contemporâneos. Há também espaço para literatura hispano-americana, crítica literária, fotografia, sexualidades, raça, gênero, entre outros temas.

Porém, mesmo que os livros sejam o principal negócio, só um acervo amplo e cuidadosamente selecionado não é garantia para chamar o público leitor, por isso há um cronograma de atividades constantes que não só agradam os frequentadores assíduos, como também chamam a atenção de novas pessoas. “Nós fazemos lançamentos de livros, rodas de conversa, temos um delicioso clube de leitura já há um tempo. Tudo para atrair um público cada vez mais amplo para a leitura”, explica Bruno.

“E como nosso foco é vender livros e não comidas e bebidas, nós temos também uma cachaça pública, gratuita e com selo de qualidade de Minas Gerais, que é servida para todas as pessoas que quiserem degustar dessa bebida tipicamente brasileira”, brinca Bruno.

E a estratégia deu certo, já que as pessoas vão para o espaço conversar, trocar ideias, ler, passear, transformando a livraria em um local bastante agitado. “Já tem gente que vem aqui e pergunta se vai ter evento hoje, vem ver as novidades que nós separamos, quais os lançamentos novos… É fantástico!” Finaliza Bruno.

Um tour por algumas livrarias

Como há uma enorme diversidade de livrarias de rua em todos os cantos do Brasil, com acervos variados ou específicos e que possuem eventos culturais que atendem públicos e cenas culturais diversas, optamos por elencar algumas do eixo Rio-São Paulo para quem tem interesse em conhecer não só o acervo, mas também as várias atividades que ocorrem por lá. Mas é bom ressaltar a importância de se visitar e, por que não, apoiar a livraria de rua mais próxima, ajudando a fomentar não só a disseminação de conhecimento através dos livros, mas também a cena cultural da região.

Começando por uma livraria de São Paulo, a Ria Livraria foi fundada por Marcos Benuthe, que era dono da tradicional (e infelizmente extinta) Mercearia São Pedro. O espaço está aberto desde 2021 e já é um dos pontos mais badalados do cenário cultural da cidade. Além da livraria, a Ria Livraria realiza encontros musicais, eventos de lançamentos, cursos, pocket shows literários, saraus, serviços de bar, possui uma revista de resenhas literárias e poesias e está lançando um selo de publicações autorais. Também tem parcerias com grandes eventos como a Balada Literária.

A Livraria Leonardo da Vinci, localizada no centro do Rio de Janeiro, tem décadas de tradição: ela está aberta desde 1952. Espaço de formação de milhares de pessoas ao longo dos anos, a livraria realiza lançamentos de livros, sessões de autógrafos com os autores, palestras, rodas de conversa, entre outros. Só em 2019 foram realizados 150 eventos no espaço! Além disso, o local faz algumas campanhas solidárias de arrecadação de mantimentos para pessoas carentes e/ou atingidas por catástrofes.

Inaugurada em 2020 por Leticia Bosisio e Martha Ribas, a Janela Livraria conta com uma curadoria de livros especializada em obras de autoria feminina. Lá também é possível encontrar atividades como lançamentos de livros, cursos, palestras, exposições de fotografias, clubes de leitura, eventos focados no público infantil e, como um grande diferencial, a venda e as degustações de vinhos, cafés elaborados pela Casa do Barista e sanduíches criados pelo chef João Diamante especialmente para o local, trazendo para o espaço mais um atrativo por suas opções gastronômicas.

Pode-se dizer que a nossa última dica literalmente renasceu das cinzas. Em julho de 2022 a Livraria Belle Epoque foi atingida por um incêndio que consumiu todo o seu acervo e mobilizou toda uma rede de solidariedade que ajudou seus donos a reconstruir seu patrimônio. Seis meses depois, com um bloquinho de carnaval, os frequentadores assistiram animados sua reinauguração e passaram a acompanhar seus eventos como palestras, lançamentos de livros, oficinas, aulas, shows musicais, entre tantos outros.

Faça seu próprio roteiro das livrarias:

Livraria Ponta de Lança está localizada na rua Aureliano Coutinho, nº 26 – Vila Buarque, na cidade de São Paulo e funciona de terça a domingo, das 11h às 21h.

Ria Livraria fica na rua Marinho Falcão, nº 58 – Sumarezinho, São Paulo, e funciona de segunda a sábado, das 16h às 00h.

Loja Monstra fica na Praça Benedito Calixto, nº 158 – 1º andar – Pinheiros, São Paulo e tem horários de funcionamento variados: de segunda à sexta das 11h às 19h, sábado das 10h às 19h e domingo das 12h às 18h.

Livraria Leonardo da Vinci está localizada na Avenida Rio Branco, nº 185 – subsolo – Centro da cidade do Rio de Janeiro. Já o horário de funcionamento também varia conforme os dias: de segunda a sexta das 9h30 às 18h30 e aos sábados das 10h às 13h30.

Janela Livraria está na Maria Angélica, nº 171 – loja B – Jardim Botânico, na cidade do Rio de Janeiro. Funciona de segunda a quinta das 12h às 19h, sexta das 12h às 20h e sábado das 10h às 19h.

Livraria Belle Epoque está na rua Soares, nº 50 – loja A – Méier, cidade do Rio de Janeiro, funcionando de segunda a sábado, das 9h às 19h.